Pra quem gosta de ler, ver e ouvir - e outras coisas do tipo.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Porque Acredito na Educação

Antes de mais nada é importante salientar aqui: sim, tem gente por aí que lê! Não só porque precisa, mas porque gosta.
Podemos aqui discutir todo o problema da falta de hábito do brasileiro de ler, por questões, por exemplo, como a falta de incentivo ao hábito da leitura nas escolas públicas. Afinal, não vivemos em um país em que o Estado incentive em nada, entende?
Não incentiva ao hábitos das artes em geral: tem muito músico que trabalha o dia todo e toca a noite... e quem nunca ouviu alguém dizer que todo músico é vagabundo? E quantas pessoas você conhece que dizem se sentir privilegiadas em frente à um quadro, sei lá, do Renoir? E quantas pessoas tem o hábito de ler, com frequência?
Melhor ainda: aqui não existe incentivo para trabalho intelectual. Só se dá valor para trabalho braçal (que, é claro, também tem muito valor), porque quem fica por aí pensando é um inútil que não quer trabalhar. Quer que eu exemplifique?
Vá fazer uma faculdade de humanas, meu caro! Você vai estudar história? Pra quê??? Mas... você vai ser professor? Você só dá aulas ou você trabalha também? E não me venha você dizer que isso é lenda, que isso não existe mais hoje em dia... eu, pessoalmente, ouvi todas essas frases, mais de uma vez!
E aí vem a escola pública! Ah! Para que o Estado vai bancar a educação da grande massa sem nada em troca? O que eles ganham: mão-de-obra barata e alienada, fácil. Você tem em mãos, em geral, uma população carente - sem boas condições de moradia, trabalho, alimentação. Aí você coloca todas elas, umas 40 ou mais, num quadrado onde só há giz, lousa e o professor. O que você espera que aconteça? Mágica?
Só um adendo: não vou defender todos os professores desses país, porque já vi cada figura por aí, que é melhor eu nem me alongar... Mas defendo que há muita gente boa querendo fazer um bom trabalho, mas não consegue. E sabe o que é pior: é que, vira e mexe, algum professor apanha por aí - e o Estado culpa a falta de preparo deles para educar o futuro do país.
Ah, mas quer saber o que é PIOR AINDA?? É ver essas propagandas ma-ra-vi-lho-sas que o Governo do Estado de São Paulo põe na Globo, dizendo que está tudo melhorando e que os professores ganham bônus de até 15 mil reais! Ó, deuses! Que perjúrio!
Tudo bem, nós vivemos em um país cheio de problemas sociais, muitos, os quais não tenho nem domínio para discutí-los aqui, agora. Nós vivemos em um país historicamente formado por um Estado com uma farta capacidade de se aproveitar da carência alheia para enganar as pessoas - e assim continua mantendo-as carentes.
Sim, somos pessoas que não damos valor àqueles que nos ensinam a ler e escrever. E volto ao início do texto: nós não lemos muito. Porque ler é coisa de nerd babaca. Nós fomos educados para não alimentar a mente: porque alimentar a mente é perigoso, vai que os caras saem fazendo revoluções por aí...
Veja só: nós, professores que, teoricamente, formamos uma categoria de trabalho "intelectualizada", que, teoricamente, deveria até mesmo encabeçar movimentos políticos no país, o que eles fazemos? Não muito. Tem uns caras do sindicato que tentam "persuadir de maneira muito efusiva" que todos façam parte de um movimento tal... e aí, o sujeito vai doar sangue cedinho pra não pegar falta! Ou então, o cara se recusa a aderir a greve porque vai perder a Licença Premium... Quanto você vale, professor? Três meses de folga? Você quer melhorer condições de trabalho ou você não quer trabalhar?
Contudo, ao mesmo tempo, eu me recuso a acreditar que não temos escolha alguma. E que todo mundo que não lê, não vai ao museu ou nem faz silêncio numa sala de cinema é assim porque é alienada - porque tem gente que se aproveita da fossa para se acomodar. Tem gente que não faz nada disso, não se dedica à absolutamente nada - e, geralmente, são as primeiras a reclamarem de alguma coisa. Livros são caros, museus nesse país são pagos (e caros pra quem ganha uns dois salários míninos) e cinema não é pra qualquer um - e qualquer pessoa deveria ter acesso à esse tipo de programa, deveria existir incentivos nas escolas para criar o hábito, deveria existir muitos programas gratuitos... É, deveria...
E você também sabe que existe aquela pessoa que tem uma espécie de orgulho de dizer que não gosta de ler e que bate no livro de alguém que está lendo, só para ter um prazer mórbido de atrapalhar o prazer alheio. Sabe aquele cara que teve acesso à uma boa instrução, mas mesmo assim se recusa a entender o conhecimento como um algo bom pra si?
Pois é... tem gente que tem escolha e escolhe ir ver novela, porque é mais fácil. Porque assim dá pra ir dormir feliz. Eu me recuso a acreditar que ninguém tenha escolha, porque é o mesmo que acreditar que nenhuma pessoa consiga tirar alguma conclusão ou mudar alguma coisinha no seu estilo de vida. É tão paradoxo e tão complexo, que funde a cabeça de tanto pensar. Mas deve chegar uma hora em que ninguém aguente mais, né? Ou será que o futebol de domingo vai bastar pra sempre?
Eu acredito na educação como forma de transformação social. Não na educação que doutrina, para um lado ou para o outro. Na educação que mostra que existe mais que um único caminho.
Na educação que mostra o conhecimento como uma arma contra a exploração.
Será que todo mundo acredita mesmo que ser brasileiro é gostar de samba, futebol e bunda - ou há uma galerinha que vive nessa porque, assim, não precisa fazer esforços? Tudo bem que o cara acha isso bonito porque há uma convenção nacional e propagandas pra isso. Mas, com um pouquinho de esforço, será que não dá pra escolher acreditar que ser brasileiro é pesquisar o cara em que se vai votar nas eleições e não escolher o mesmo fulano que já deu escândalo umas 20 vezes? Ou anular seu voto e mostrar que você não concorda com nenhum deles? Mal conhecemos nossa própria história... e nem nos lembramos da última eleição...
Hoje vi que uma matéria sobre do CQC, programa jornalístico semanal da Band, foi censurada. Aquele quadro Proteste Já. Vejam só, minha gente: CENSURA. Aí tenho que ouvir um sujeito qualquer dizer "pobrezinhos dos cubanos, eles não tem liberdade!". E você, tem?

Um comentário:

  1. Pois é, aí que tá o negócio. Se a gente desacredita da capacidade de mudança das pessoas, somos reacionários ou pessimistas (resumindo: somos uns incapazes que não conseguem pensar POSITIVO, o que pra mim é puro psicologismo), e se a gente acredita, somos idealistas! Eu, por exemplo, ANULO meu voto e sou obrigado a ouvir as pessoas dizerem que é o pior que faço. Mas será que as pessoas não entendem que as coisas estão num pé muito mais crítico do que a mera questão de votar e escolher entre candidatos que, diga-se de passagem, são todos picaretas? Será que não é melhor uma postura de recusa do que simplesmente votar em qualquer um? Se votar (ou seja, apertar uns botoezinhos a cada dois anos e ver acontecer sempre a mesma putaria) mudasse algo, eu não estaria com quase trinta anos vendo as coisas degringolarem e sentindo isto na pele.

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